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Estabilidade de Tensão e o Gerenciamento dos Sistemas Elétricos de Potência

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Estabilidade de Tensão e o Gerenciamento dos Sistemas Elétricos de Potência

Dentre os diversos fenômenos que afetam a qualidade de energia, um vem ganhando particular atenção dentro da comunidade científica – a estabilidade de tensão. Aqui é abordado como esse tema influencia nas atividades de expansão e de operação dos sistemas elétricos de potência.


Por André Igor Nóbrega da Silva


I - Introdução

Dentre as diversas teorias existentes para explicar o sucesso evolutivo dos humanos frente aos demais hominídeos, talvez uma das mais interessantes se refira a uma curiosidade infindável que possuímos em explicar os fenômenos à nossa volta. Em tardes chuvosas, com relâmpagos, raios e trovões – em épocas nas quais as maiores preocupações da humanidade eram encontrar comida para sobreviver – alguns indivíduos se propunham a pensar sobre aquelas imensas descargas de energia sobre a terra. A partir daí, séculos se passaram e cada civilização ao longo da história criou explicações para o que hoje é conhecido como eletricidade. Os gregos afirmavam que era Zeus manifestando sua ira ao jogar raios na humanidade. Para os nórdicos, era Thor que girava seu martelo e todo aquele poder era emanado.

(Figura 1): Tempestade de raios. Fonte: https://www.tecmundo.com.br/exploracao-espacial/58404-astronauta-filma-tempestade-raios-partir-espaco.htm

Com a evolução do pensamento científico, esses mitos foram perdendo espaço. Mentes como a de Alessandro Volta, André-Marie Àmpere, George Simon Ohm e Nikola Tesla, conseguiram explicar com clareza tudo aquilo que era invisível aos olhos. Atualmente, a energia elétrica não se dá ao luxo de possuir explicações e abordagens fantasiosas. Trata-se, possivelmente, do setor mais fundamental no que concerne ao desenvolvimento das Nações e, portanto, trabalhar para que essa seja gerada, distribuída e transmitida para todas as regiões de um país é uma das tarefas mais sóbrias possíveis.

Com o aumento do consumo desse recurso, surge a necessidade de integrar os diversos parques de geração de energia. É bastante difundida a ideia de que quanto mais diversificada a matriz energética de um local, mais confiabilidade ela terá. Isso acontece devido a um conceito simples: se determinado tipo de geração apresenta uma baixa de produtividade causada, por exemplo, por um problema ambiental, as outras formas podem suprir essa falta de modo que nenhuma região deixe de ser abastecida.

Dentro desse contexto, surgem duas importantes atividades de alta preocupação para a engenharia elétrica – as atividades de expansão e de operação dos sistemas elétricos de potência. Mesmo atuando com metas comuns, essas tarefas possuem objetivos particulares e específicos no sentido de obter o maior aproveitamento das capacidades do sistema com segurança e qualidade. Enquanto a expansão atua no sentido de prover os sistemas elétricos com novos recursos, a operação gerencia os já existentes. (CONDEGA, 2013)

Para que essas atividades sejam efetuadas com sucesso, existem diversos fenômenos com os quais os engenheiros devem tomar cuidado pois afetam diretamente a qualidade da energia que é fornecida à rede. Um desses fenômenos vem ganhando particular atenção dentro da comunidade acadêmica. Tratam-se dos estudos acerca da estabilidade de tensão. A literatura técnica sobre esse tema é bastante vasta. No que concerne aos conceitos básicos destacam-se os livros (CUTSEM, 1998), (KUNDUR, 1994), (TAYLOR, 1994) e (AJJARAPU , 2006). Neste texto será discutida, apenas, uma introdução ao assunto, dando ênfase em sua importância para as atividades mencionadas.

De acordo com o Instituto de Engenheiros Eletricistas e Eletrônicos (IEEE), a estabilidade de tensão é definida como: “A capacidade do sistema de manter as suas tensões de forma que, quando a admitância da carga crescer, a sua potência também aumentará, pois tanto a demanda quanto as tensões são controláveis.”. Tal noção é importante para garantir a segurança de tensão, isto é, a capacidade do sistema operar estável mesmo após a ocorrência de alguma contingência.

No sentido de prover o país com novos recursos energéticos, garantindo uma operação adequada no presente e no horizonte de tempo analisado, é necessária a execução das atividades de expansão dos sistemas elétricos de potência. Essa meta é composta por três tarefas básicas: planejamento, projeto e execução do plano (VALE, 2012)

(Figura 2): Etapas das atividades de expansão dos sistemas elétricos de potência. Fonte: (MENEZES, 2007)

Esse campo de atuação leva sempre em conta a adoção de uma margem de estabilidade de tensão adequada. Essa margem se refere à distância entre o ponto atual de tensão de operação da rede e o ponto em que ocorre a tensão crítica, ocasionando o possível colapso do sistema. Devido ao horizonte de planejamento desta atividade, os problemas que podem afetar o sistema devem ser identificados com antecedência, da mesma forma que as ações a serem adotadas para minimizar seu impacto na operação futura do sistema elétrico de potência (SEP). (CORTEZ, 2001)

Adicionalmente, o uso de ferramentas estatísticas e probabilísticas no planejamento que, embora sejam bastante precisas, não conseguem contemplar fenômenos que escapam ao seu espaço de atuação (cenários políticos ou econômicos tanto nacionais como internacionais, por exemplo), justifica a consideração de limites ou margens que possam garantir uma operação segura do SEP durante todo o horizonte de planejamento previsto. É neste contexto que a margem de estabilidade de tensão se insere. (CORTEZ, 2001)

Uma margem de estabilidade de tensão (MET) inadequada pode interferir significativamente nas projeções e nos investimentos a serem feitos para o horizonte de projeto considerado. Adotando-se uma margem subdimensionada, o sistema poderá apresentar operação em condições de risco, em termos de estabilidade de tensão, em um período de tempo menor do que o previsto. Por outro lado, o superdimensionamento da margem poderá gerar um investimento muito elevado, podendo torná-lo financeiramente inviável. (CORTEZ, 2001)

A atividade de operação da rede, por sua vez, se refere ao manuseio e à manutenção dos sistemas, ou seja, ao gerenciamento dos recursos já existentes. Até meados do século XX, a mentalidade vigente em relação à essa administração era local. Com o crescimento das demandas, tal controle passou a ser interligado em escalas nacionais. Para cumprir o seu objetivo, a operação executa três etapas básicas: planejamento de operação, operação em tempo real e pós-operação (VALE, 2012).

Figura 3: Etapas das atividades de operação dos sistemas elétricos de potência. Fonte: (MENEZES, 2007)

O conjunto dessas três tarefas envolve a adoção de medidas automáticas de controle da rede, por meio das instruções operativas, as quais visam manter o sistema funcionando de acordo com os padrões. Além disso, utiliza-se a análise de condições diferentes e de erros passados como forma de realimentação do conhecimento. No que se refere a importância da margem de estabilidade de tensão na atividade de operação, podemos destacar segundo a CONDEGA (2013) que

As Instruções Operativas geradas nos estudos de planejamento da operação devem considerar uma margem de estabilidade de tensão bem dimensionada para garantir a segurança do SEP sem, contudo, limitar o uso dos recursos existentes na rede. Na operação em tempo real nem sempre se apresentam as mesmas condições previstas no planejamento e, portanto, o comportamento do SEP deve ser monitorado para verificar se a margem de estabilidade de tensão está sendo respeitada. Isto favorece ações de controle preventivo.

A abrangência dos estudos acerca da estabilidade de tensão é bastante complexa. Aliar esse conhecimento a todos os fatores sociais, políticos e econômicos que regem como e para onde os recursos dos sistemas elétricos de potência devem ser alocados não é, de maneira alguma, uma tarefa trivial. Ademais, é possível afirmar que o dimensionamento correto da margem de estabilidade de tensão é fundamental tanto para as atividades de expansão quanto de operação da rede.

A humanidade já evoluiu muito no tratamento da energia elétrica, mas, dizer que aproveitamos completamente todo o potencial desse recurso é, ainda, uma falácia. Contudo, o esforço atual para desenvolver a rede e garantir a geração, a transmissão e distribuição adequada da energia é imenso. Diversos estudos são feitos para entender e superar, adequadamente, problemas que envolvem, não somente a estabilidade de tensão, mas a qualidade de energia como um todo.




Referências: 

A. N. Cortez, “Proposta de Critérios e Procedimentos para Avaliação da Estabilidade de Tensão em Sistemas Elétricos de Potência”, Dissertação de Mestrado em Engenharia Elétrica, Orientador: Maria Helena Murta Vale, Programa de Pós Graduação em Engenharia Elétrica (LRC/PPGE), Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Fevereiro 2001.

T. V. Cutsem, C. Vournas, “Voltage Stability of Electric Power Systems”, Power Electronics and Power Systems Series, Kluwer Academic Pub, United Stated, March 31, 1998, 378 pages.

P. Kundur, N. J. Balu, M. G. Lauby, “Power System Stability And Control”, Electric Power Research Instititute, McGraw-Hill India, January 1, 1994, 1176 pages.

M. H. M. Vale, “Notas de Aula da Disciplina Supervisão e Controle”, Curso do Programa de Pós Graduação em Engenharia Elétrica (LRC/PPGE), Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2012.

CORREIA, Sandro Yohasner Chavarria. Metodologia para Determinação da Margem de Estabilidade de Tensão sob a Perspectiva da Expansão e da Operação dos Sistemas Elétricos de Potência. 2013.










          









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