Universos Paralelos
A ideia de Universos Paralelos é retratada, muitas vezes, como puramente ficcional. Porém, por trás de muitas dessas ideias, existe um grande embasamento científico que as sustentam.
Por Pedro Henrique Oliveira Toscano Ximenes
Ao se falar em Universos Paralelos, normalmente o primeiro pensamento de todos é sobre obras de ficção. Pensa-se em Histórias em Quadrinhos, com seus personagens superpoderosos e várias realidades; em desenhos animados em que personagens animais, por exemplo, são humanoides, como no aclamado Bojack Horseman, ou em filmes em que várias realidades existem ao mesmo tempo.
Algo interessante acerca desse tema é o fato de que os Universos Paralelos, ou Multiversos, podem realmente existir e diversas hipóteses que suportam essa ideia são efetivamente científicas, fundamentadas nas mais diversas áreas da Ciência e com uma forte base matemática. Contudo, é evidente que muitas ideias acerca da existência de um Multiverso são puramente ficcionais e alguns acreditam e defendem veementemente apesar da falta de qualquer embasamento científico.
A verdadeira Ciência, porém, se ocupa com a tentativa de entender o ainda muito misterioso Universo em que vivemos. Por que, então, se preocupar com possíveis outros Universos se ainda entendemos tão pouco do nosso próprio? A resposta está na pergunta: a existência de Universos Paralelos pode justamente solucionar diversas dúvidas que atormentam os cientistas, como a frequente pergunta “Por que o Universo funciona?”. Para alguém que nunca se indagou sobre isso, essa pode ser uma pergunta tola a se fazer. Entretanto, após uma rápida análise crítica acerca da própria existência do Universo, percebe-se que não se trata de uma pergunta tão tola assim.
Existem diversas leis universais que regem o funcionamento de tudo o que se conhece. Há um grande embasamento matemático por trás dessas leis para que elas sejam possíveis, com teorias complexas e constantes universais bem definidas e precisas (algumas destas podem ser vistas na Tabela 1). Para que tudo seja “perfeito”, ou seja, para que exista um Universo habitável, é necessário que todas as constantes universais existam em conjunto e assumam exatamente o seu próprio valor.
Tabela 1. Algumas constantes universais.
Qual o motivo, então, do Universo não ser apenas complicado e aleatório o suficiente a ponto de não ser viável? Probabilisticamente, existem muito mais possibilidades de que qualquer constante assuma qualquer outro valor além do esperado, o que poderia implicar na existência de um Universo completamente diferente do que estamos habituados ou mesmo na inexistência dele. Se a constante gravitacional G assumisse o valor 8 × 10-11 m3/kg × s2, por exemplo, a “força extra” que se resultaria poderia ser suficiente para impedir o acontecimento de Supernovas, assim, não existiria a formação de estrelas, de planetas e, consequentemente, não existiria vida.
Apesar de nenhuma suposição para a existência de Universos Paralelos ter sequer sido testada experimentalmente, muitos cientistas acreditam que muitas respostas podem ser obtidas caso alguma dessas hipóteses seja confirmada. Ao se tratar da Ciência por traz de um possível Multiverso, três modelos completamente não-relacionados entre si são mais embasados física e matematicamente, são eles: a Teoria das Membranas, a teoria da Bolha (Universos Bolha) e os Universos Bebês e a Interpretação dos Muitos Mundos.
É importante perceber, portanto, que existe um problema de nomenclatura em relação a alguns fatos científicos. A Teoria das Cordas, Teoria das Membranas ou Teoria das Bolhas, por exemplo, não são, de fato, o que o nome sugere. Para que uma ideia seja considerada uma teoria científica, ela deve ser apoiada em evidências com um amplo conjunto de dados submetidos a várias circunstâncias. Deve ter sido testada e provada através de diversos experimentos repetidas vezes e, por fim, sua veracidade pode ser comprovada. Por não obedecer a esses critérios, elas não são efetivamente teorias científicas e são assim chamadas apenas por conveniência de nomenclatura.
Teoria das Membranas
Embasada na impossibilidade da Teoria das Cordas de ser confirmada matematicamente ou testada experimentalmente, a Teoria das Membranas, ou Teoria-M, afirma que existem, na verdade, nove dimensões espaciais, porém, só é possível que observemos três. Essa teoria sustenta a ideia de que nós vivemos em um Universo tridimensional “preso” a um “Super Universo” de nove dimensões.
A mesma relação, com ajuste de escala, pode ser observada nas páginas de um livro. As folhas são objetos bidimensionais que não possuem interação entre si e que fazem parte de um objeto tridimensional, o livro. Portanto, nosso Universo estaria “localizado” em apenas três das nove dimensões existentes no Super Universo.
Figura 1. Possível interpretação das nove dimensões espaciais previstas na Teoria das Cordas. [Fonte: https://anoitan.wordpress.com/tag/teoria-das-super-cordas/].
Universos-Bolhas e Universos-Bebês
Segundo essa teoria, existiriam partes do Cosmos tão distantes umas das outras que jamais poderiam interagir ou mesmo serem vistas de alguma das outras partes. Cada “bolha” seria, portanto, um Universo independente que opera com suas próprias leis e constantes, formando “Universos-Bolhas”.
Essa ideia surge como uma tentativa de explicar o motivo de que no nosso Universo tudo “conspira” a favor da formação de estrelas, planetas e vida. Cada Universo Bolha, com suas próprias constantes, seria diferente de outro, podendo ser favorável ou não à presença de vida. Assim sendo, nós apenas viveríamos em um Universo onde todas as constantes se comportam de maneira oportuna. Tudo se trata de uma questão de probabilidade.
Figura 2. A Teoria das Bolhas foi de fato nomeada como uma analogia a bolhas. [Fonte: http://www.chakracommunity.com/2015/06/bubble-theory/].
Existe também a possibilidade de que outros Universos estejam dentro de buracos negros. Ao absorver matéria, um buraco negro poderia dar início a um novo Universo dentro de si, que, da mesma maneira, nunca poderia interagir ou ser visto em outro Universo, formando “Universos Bebês”. Essa ideia foi proposta pelo prestigiado físico britânico Stephen Hawking.
Interpretação dos Muitos Mundos
A ideia dos Muitos Mundos da Mecânica Quântica pode até não parecer razoável à primeira vista. Porém, ela é considerada uma das puras interpretações da matemática da Mecânica Quântica e provavelmente será a primeira hipótese para a existência de Universos Paralelos a ser testada experimentalmente.
Para que se possa entender qualquer coisa sobre o Modelo Quântico, é necessário saber que o “mundo quântico”, ou seja, o mundo na escala de partículas e átomos, é completamente diferente do mundo macroscópico. Na Teoria Quântica, tudo é incerto e tratado por probabilidades, por exemplo: o Princípio do Tunelamento Quântico permite que partículas ultrapassem barreiras de energia potencial maior do que sua própria energia cinética; fazendo uma analogia ao mundo tal qual conhecemos, seria como um ser humano atravessar uma parede. A Dualidade Onda-Partícula afirma que uma partícula se comporta como uma partícula em parte do tempo e como uma onda em outra parte. Esses são apenas alguns exemplos de fenômenos que ocorrem na escala subatômica que podem parecer um absurdo físico na escala macroscópica. Para demonstrar justamente essa relação ilógica, o físico austríaco Edwin Schrödinger propôs um experimento imaginário que passaria a ser conhecido como o “Gato de Schrödinger”.
Schrödinger utiliza um gato como uma analogia a uma partícula qualquer. No experimento, o gato é colocado em uma caixa, completamente vedada e sem nenhuma ligação com o exterior, juntamente com um sistema que pode quebrar ou não um tubo contendo veneno. A probabilidade de que o tubo seja quebrado (o que ocasionaria a liberação do veneno e, consequentemente, a morte do gato) é igual à probabilidade de que o tubo continue intacto (ou seja, o gato permanece vivo). Para que seja possível saber o que aconteceu com o animal, é necessário abrir a caixa e verificar o seu estado, que deverá ser ou morto ou vivo. Porém, até que aconteça a interação com o mundo exterior, ou seja, até que se abra a caixa, o gato encontra-se em uma superposição de estados; em outras palavras, ele está ao mesmo tempo vivo e morto.
Por mais estranho que pareça, é dessa forma que se comportam as partículas subatômicas; elas estão em constante superposição de estados. Apesar de ser possível prever probabilisticamente qual o estado em que a partícula se encontrará depois da interação, o que ainda não é entendido pela Ciência é como a transição de um estado para outro ocorre. A atual explicação para esse fato é a de que “o Universo faz uma escolha” e, a partir dessa escolha, os eventos são decorridos.
A Interpretação dos Muitos Mundos diz que não existe “escolha” para qual evento se suceder, mas todas as possibilidades ocorrem em linhas do tempo diferentes. Quando uma decisão precisa ser feita, ou seja, toda vez que ocorre interação com o mundo exterior, a linha do tempo atual é dividida e ambos os eventos acontecem em realidades diferentes que nunca poderiam interagir uma com a outra. Segundo essa interpretação, para cada decisão já feita por qualquer pessoa, por qualquer partícula ou qualquer interação existe um “mundo” diferente onde a linha do tempo surgiu no momento da decisão.
Figura 3.
Quebra da linha do tempo após decisões tomadas. [Fonte: https://www.youtube.com/watch?v=Ywn2Lz5zmYg&t=98s]
Apesar de todas essas ideias possuírem embasamento teórico e científico, nenhuma delas é unânime dentre os cientistas. É importante lembrar que nenhuma delas foi sequer testada experimentalmente e, portanto, nenhuma pode ser considerada correta do ponto de vista científico, mas oferecem uma ideia e despertam a curiosidade de cientistas que podem, no futuro, comprová-las ou refutá-las.
Referências:
Uma Breve História do Tempo. Stephen Hawking. Intrínseca, 2015.
A Seta do Tempo, Entropia e Caos. Pedro Henrique Oliveira Toscano Ximenes. JORNAL PET ELÉTRICA, 23 de julho de 2017.
Sean Carroll: Distant time and the hint of a multiverse. TED Talks. Disponível em https://www.ted.com/talks/sean_carroll_distant_time_and_the_hint_of_a_multiverse#t-10960. Acesso em 19 de julho de 2017.
How many universes are there? – Chris Anderson. TED Talks. Disponível em https://ed.ted.com/lessons/how-many-universes-are-there. Acesso em 26 de julho de 2017.
The Many Worlds of the Quantum Multiverse. PBS Space Time. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=dzKWfw68M5U. Acesso em 19 de julho de 2017.
|