Matéria Escura e Energia Escura
A matéria como conhecemos – átomos, moléculas, humanos, aviões e estrelas – compõe menos de 5% do Universo observável. A matéria escura, responsável por 80% da massa total do Universo, possibilita a formação de galáxias. A energia escura, compondo quase 70% da energia do Universo, causa a expansão acelerada deste.
Por Thiago Oliveira Delmiro Neves
A matéria como popularmente conhecemos – átomos, moléculas, células, humanos, aviões, planetas, estrelas e galáxias – compõe aproximadamente 5% do Universo observável. A partir do século XX, o conceito de matéria foi revolucionado pelas observações de Edwin Powell Hubble, pela Teoria da Relatividade de Einstein e por correções de modelos matemáticos incondizentes com a realidade.
Em 1929, Edwin Hubble analisou o comprimento de ondas de luz emitidas por galáxias distantes e seu deslocamento em relação ao vermelho do espectro eletromagnético. Assim, ele observou que galáxias muito distantes apresentavam um deslocamento mais rápido, ao passo que galáxias mais próximas deslocavam-se mais lentamente. A partir disso, Hubble concluiu que o Universo está em expansão e, apenas no final do século, descobriu-se que essa expansão é acelerada – quanto mais distantes os objetos, mais rápido esses se afastam da referência. Tal expansão é causada pela energia escura.

Enquanto estudava aglomerados de galáxias no Instituto de Tecnologia da Califórnia em 1933, o astrofísico suíço Fritz Zwichy percebeu que as galáxias nesse aglomerado se moviam em uma velocidade acima do esperado, o que deveria causar a saída de tais galáxias do seu grupo. Essa observação implicava num campo gravitacional de intensidade muito maior que o considerado, podendo ser explicado por uma massa adicional nesse meio. Em cálculos posteriores, Zwichy estimou uma massa 400 vezes maior que a observável, evidenciando, então, o efeito do que ele chamou de matéria escura.
A denominação “escura” foi dada a esses fenômenos pois a matéria escura não interage com ondas eletromagnéticas e, até o momento, não há como detectar, medir ou sentir a energia escura.
A matéria escura é o que possibilita a formação de galáxias e suas estruturas, contribuindo com a grande parte da massa destas, permitindo a atuação da gravidade e a manutenção de seu formato. Sua descoberta foi influenciada por modelos matemáticos que mostravam a dispersão da maior parte das estrelas de galáxias, significando que a massa do sistema estava subestimada.
A maior evidência para a matéria escura é a sua interação com a força gravitacional, pois ao passar por uma concentração desse tipo de matéria, a luz sofre distorção assim como ao viajar próximo a estrelas ou buracos negros. Sabe-se que a matéria escura não está igualmente distribuída pelo Universo e que se concentra em galáxias e aglomerados, evidenciando uma movimentação lenta. A matéria escura representa 26,8% da energia total do Universo, sendo 80% da massa deste.
A comprovação do Bóson de Higgs e o aprofundamento dos estudos dessa partícula podem dispor uma forma de detectar a matéria escura, uma vez que a existência do Campo de Higgs pode determinar os mecanismos pelos quais partículas possuem mais ou menos massa, quando sequer possuem massa, o que está diretamente ligado à interação da matéria escura com a gravidade.
Embora não se saiba o que realmente é a matéria escura, sabe-se que não é formada apenas por nuvens de matéria “comum” onde não houve formação de estrelas, pois essas nuvens emitiriam partículas detectáveis pela tecnologia humana; não é antimatéria, já que esta produz raios gama específicos quando interage com matéria; também não são buracos negros, pois estes são corpos demasiadamente densos em uma região muito pequena, enquanto a matéria escura permeia todo o meio de uma galáxia ou aglomerado.
Anteriormente às observações de Hubble, pensava-se que a força da gravidade iria reduzir a velocidade com a qual as galáxias se afastam entre si ou até contrapor o sentido da expansão e colapsar o Universo novamente em um ponto. Contudo, é notável que, após certo tempo, uma força passou a agir sobre todo o espaço, acionando a aceleração da expansão.
A ideia por trás da energia escura é que enquanto a matéria “comum” e a radiação se tornam cada vez menos densas à medida que o Universo expande, a energia escura mantém sua densidade constante. Assim, quanto mais espaço é produzido no Universo, mais energia escura surge para manter sua densidade, dessa forma, empurrando cada vez mais rapidamente as estruturas galácticas.
Essa sugestão é similar ao que Einstein chamou de Constante Cosmológica, em 1917. A Constante é uma forma de dar sentido à Relatividade Geral, atribuindo uma densidade energética ao espaço vazio, sendo então uma densidade de energia que se opõe à gravidade para que o Universo não se contraísse em si mesmo. Quando Hubble anunciou sua descoberta 12 anos depois, Einstein deixou de lado a sua ideia.
Outra observação de Einstein relaciona a geometria do Universo a sua densidade. Cosmólogos conseguiram “medir” o formato planar ao examinar a radiação cósmica de fundo em micro-ondas, contudo, o total de matéria, “comum” e escura, não era suficiente para a densidade e geometria observadas. Felizmente, a mesma quantidade de energia escura necessária para explicar a expansão acelerada do Universo é a que satisfaz a densidade para um Universo plano como o observamos.
Um dos métodos para testar conclusões sobre a matéria escura e energia escura é a lente gravitacional. Esse processo descreve como a gravidade distorce a luz, principalmente como objetos massivos no Universo curvam a luz de galáxias quando ela passa por eles. Um campo gravitacional intenso pode causar a curvatura da luz de tal forma que múltiplas imagens da galáxia emissora de luz são formadas. Efeito de lente gravitacional mais fraco resulta em imagens distorcidas de galáxias, podendo ser esticadas ou ampliadas.
A análise da lente gravitacional fornece informações sobre como a matéria escura está distribuída em galáxias e a distância destas. Assim, tal método garante meios de investigar o desenvolvimento da estrutura do Universo assim como o de sua expansão.
É assustador pensar que ainda não temos ideia do que seja a matéria escura e a energia escura, que juntas compõem 95% do Universo observável. É espantoso saber que não sabemos quase nada da totalidade de onde vivemos. Todavia, um mundo de dúvidas e questionamentos, repleto de coisas a serem descobertas, não deixará de nos surpreender, maravilhar e intrigar por um bom tempo.
Referências:
Galaxy Clusters Reveal New Dark Matter Insights. NASA. Disponível em https://www.nasa.gov/feature/jpl/galaxy-clusters-reveal-new-dark-matter-insights. Acesso em 28 de Dezembro de 2016.
Dark Matter. Wikipedia. Disponível em
https://en.wikipedia.org/wiki/Dark_matter#Cosmic_microwave_background_radiation_.28CMB.29. Acesso em 28 de Dezembro de 2016.
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Written in the stars. The Royal Swedish Academy of Sciences. Disponível em http://www.nobelprize.org/nobel_prizes/physics/laureates/2011/popular-physicsprize2011.pdf. Acesso em 29 de Dezembro de 2016.
The dark stuff of our universe. Nova. Disponível em http://www.nova.org.au/space-time/dark-stuff-our-universe. Acesso em 28 de Dezembro de 2016.
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