Quebrando Limites: um pouco do Overclock
Sistemas de refrigeração com nitrogênio líquido, sucessivas quebras de recordes de processamento e máximo desempenho de hardware: Um pouco do que é o overclock.
Por José Iuri Barbosa de Brito
O alto desempenho de hardware sempre foi o principal objetivo de muitos fabricantes e apaixonados por computadores. Os criadores de peças sempre buscam melhorar o desempenho de seus equipamentos, entregando ao consumidor o melhor produto em termos da relação custo-benefício. Já os entusiastas pelo alto desempenho buscam “quebrar” as limitações dos fabricantes e procuram atingir o máximo da capacidade dos componentes, prática conhecida como overclock.
O termo é utilizado para descrever o estado de um componente de hardware que opera acima da frequência definida pelo fabricante. Essa prática é bastante comum desde os primeiros computadores e pode ser implementada de diversas maneiras. Realizar o aumento no desempenho requer conhecimentos técnicos e alterações realizadas diretamente nos especificações características do componente, ou seja, fazer com que as placas reconheçam que o componente possui características superiores aos valores reais.
Para entender o funcionamento do overclock, é necessário compreender o processo de fabricação dos componentes, principalmente dos processadores. Os chips são fabricados contando com duas frequências principais: uma externa e outra interna. A frequência interna, ou clock interno, é a mais conhecida e a que vem estampada no componente (500 MHz, 700 MHz, etc.). A frequência externa, ou clock externo, é a velocidade de comunicação da CPU com as demais partes da placa-mãe, geralmente variam entre 66 MHz a 133 MHz para placas que utilizam o FSB (Front Side Bus). A velocidade externa é o fator limitante da capacidade dos processadores, pois um processador que opera a 2.8 GHz pode apresentar o mesmo desempenho de um que opera a 1 GHz quando ligados à mesma frequência externa de 66 MHz. Outro dado importante é o multiplicador, número característico que permite definir a operação do clock interno com base no externo. Os multiplicadores atuam da seguinte forma: um processador com multiplicador de 10x em uma placa-mãe que opera à frequência de 133 MHz permite como frequência interna máxima 1330 MHz.
Máquinas modernas possuem outros sistemas de comunicação entre a placa-mãe e o processador. O QuickPath Interconnect (QPI), utilizado nos chips mais recentes da Intel, e o HyperTransport, aplicado nas CPUs da AMD são os mais empregados para alto desempenho. A maior diferença desses modelos de arquiteturas para o FSB é que permitem a comunicação de duas vias, de forma que o processador possa transmitir e receber dados ao mesmo tempo, já que cada atividade é direcionada a uma via, beneficiando o aspecto do desempenho.

O que overclock efetivamente faz é melhorar a comunicação, tanto da parte externa ao processador quanto aumentar a frequência interna. As diversas técnicas de overclocking permitem que o hardware da máquina supere o limite de ambas as frequências do processador. Para manter o overclock, também é necessária a manutenção das características físicas do processador, como temperatura e tensão, que podem variar quando o componente é submetido a condições de uso extremas. O aumento de desempenho pode ser observado diretamente no funcionamento da máquina, que se torna mais “rápido”. Entretanto, forçar o componente a funcionar em uma velocidade superior à indicada pelo fabricante pode acarretar problemas de estabilidade e danos permanentes à peça.
O primeiro caso comum de overclock aconteceu em meados de 1988 com a linha Intel Pentium, que contava com dois modelos principais: o 233 MMX e o 166 MX, o primeiro mais caro e com desempenho melhor. Alguns usuários exploraram os processadores e descobriram que o 166 MX poderia operar acima do indicado e se igualar a outra versão custando bem menos.
Com o aumento natural do desempenho dos processadores e do overclock, muitas aplicações, que sincronizavam as ações de acordo com a frequência da CPU, ficaram ultrapassadas e ao rodar nas máquinas mais potentes operavam de maneira demasiadamente acelerada, nesse estado era impossível compreender as mensagens e sinais que o programa exibia rapidamente. A solução encontrada para esses casos foi à criação do “botão turbo”, que aparentemente fazia com que a aplicação parasse de travar. O funcionamento do botão era bem simples, ao ativar a função “turbo” o computador na verdade entrava em estado de underclock, ou seja, funcionava em uma velocidade inferior. Como as aplicações fluíam melhor, dava a impressão de que o computador estava mais rápido. Nas máquinas recentes o temporizador de ações é virtual fazendo com que os programas funcionem na velocidade correta.
Com a evolução dos processadores, as práticas de overclock ficaram mais robustas. A primeira marca chamativa ocorreu no começo do segundo milênio, quando um processador AMD Athlon 800 MHz chegou ao impressionante 1 GHz por meio de um poderoso sistema de refrigeração por compressão Kyrotech. Esse foi o primeiro caso observado de um processador romper a barreira dos 1000 MHz. O ocorrido ganhou repercussão e chamou a atenção das fabricantes para essa prática, fazendo com que as próprias empresas facilitassem o aceleramento do hardware.
A prática do overclocking se tornou tão popular que foram criadas ligas de competição profissional e foi formada uma grande rede de entusiastas da prática. Muitos dos praticantes viajam o mundo mostrando seus feitos e recordes. A formação de ligas de competição e o registro de dados oficialmente geraram grandes avanços e marcas impressionantes.
Nas ligas profissionais, muitas equipes são patrocinadas por empresas de tecnologia e montam seus equipamentos com uma estrutura incrivelmente robusta, chegando a utilizar nitrogênio líquido para manter baixa a temperatura dos processadores e permitir o aumento na frequência.
A atual líder do quadro geral das competições é a equipe alemã Hardwareluxx.de. A equipe possui atualmente 333 membros e dois capitães que também estão no topo do ranking individual. A mais recente marca obtida foi com um processador Intel Core i7 6950X que alcançou a incrível marca de 5301MHz, que representa um aumento de 76.70% da capacidade de processamento, que é originalmente é de 3500 MHz.
Figura 3. Equipe alemã Hardwareluxx.de trabalhando na sua máquina. Nota-se a utilização de nitrogênio líquido na parte inferior esquerda da foto. [Fonte: Asus Overclocking Cup 2014]
Um dos métodos de avaliação do desempenho das máquinas é um aplicativo de 1995 chamado SuperPI. O benchmark, registrador de marcas obtidas, tem como propósito o cálculo do valor do número Pi. As principais modalidades disputadas são a SuperPI 1M (1 milhão de casas decimais) e SuperPI 32M (32 milhões de casas decimais). Com o passar do tempo os resultados são notáveis, como mostra o gráfico abaixo.
Figura 4. Evolução dos tempos recordes na modalidade SuperPI 32M, a marca recorde atual é de 5 minutos. [Fonte: hwbot.org]
A prática do overclock é bastante difundida nos dias atuais, se transformando em um hobbie de entusiastas de hardware. Mas, muito além da brincadeira, as marcas obtidas em competições representam grandes avanços no campo de sistemas de arquitetura de sistemas e de processadores. Famosas técnicas de overclock foram mais tarde incorporadas em escala comercial, principalmente os sistemas de refrigeração. A difícil tarefa de quebrar os limites é o que impulsiona cada vez mais os overclockers e é possível que seja nas mãos deles que cheguemos a romper a nova barreira de 10 GHz.
Referências:
CPUs and Overclocking, A Love Story. HWBOT. Disponível em http://hwbot.org/news/10303_cpus_and_overclocking_a_love_story_by_xyala. Acesso em 22 de Agosto de 2016.
A brief history of clock. ArsTechnica. Disponível em http://archive.arstechnica.com/cpu/2q99/clock-intel-1.html. Acesso em 22 de Agosto de 2016.
Need for speed: a history of overclocking. TechRadar. Disponível em http://www.techradar.com/news/computing-components/processors/need-for-speed-a-history-of-overclocking-540671/2. Acesso em 22 de Agosto de 2016.
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