Margaret Hamilton, 1984 e a Grande Mudança
Um dos aspectos que mais admiram em Margaret Hamilton é que ela representa muito daquilo que se dizia - e muitos ainda dizem - que uma mulher não seria capaz de ser: cientista, engenheira e CEO. Na década de 1960, com 24 anos de idade e uma filha criança para cuidar, Hamilton tinha apenas uma graduação não concluída em matemática, quando conseguiu um emprego como programadora no MIT. Seus planos eram de bancar os estudos de Direito em Harvard de seu marido por três anos e, depois, concluir os próprios em matemática. Contudo, em 1961, o programa Apollo chegou ao seu laboratório e Margaret se tornou uma peça chave para o sucesso do projeto. Ela junto com seus colegas trouxeram o conceito de software para o mundo da tecnologia, quando engenharia de software nem era um curso. Seus códigos foram responsáveis por trazer os astronautas da Apollo 8 (1968) de volta à Terra e de que, muito provavelmente, o pouso da Apollo 11 (1969) na Lua não fosse um desastre.
Hoje a ideia de software pode até parecer simples, afinal, é aplicada em diversos sistemas, básicos a sofisticados. Mas em 1960 a realidade era outra. Nem nos arquivos iniciais do Programa Apollo a palavra “software” era mencionada, nem os custos do projeto levavam isso em consideração. Graças a Hamilton que podemos contar com o design de software ultra confiável, extremamente necessário para os padrões atuais. Por todas as repercussões tecnológicas que isso possui, o feito de Hamilton já é extraordinário. Mas ao lembrar que ela o conseguiu em uma época na qual nenhuma mulher era encorajada a trabalhos técnicos de alta potência, torna-o algo ainda maior. Torna-o uma prova. Torna-o uma forma de deixar claro o quanto as mulheres foram privadas de explorar suas potencialidades durante séculos. Torna-o um meio de refutar o passado.
A História evidencia incontestavelmente a descrição de um mundo machista. Na Grécia Antiga, as mulheres até podiam conhecer e estudar a filosofia e as outras ciências que surgiam, mas eram proibidas de participar da vida política porque não eram consideradas cidadãs. No Iluminismo, outro período de significativo progresso intelectual, quando a ciência ganhou mais valor e um método foi criado, os homens excluíram as mulheres dela também. A ciência se tornara algo muito importante para as mulheres entenderem, diziam alguns dos considerados maiores pensadores da época. Existiam aquelas que protestavam contra isso, sim. Geralmente pertencentes às altas classes e, mesmo assim, poucas destas conseguiam ser ouvidas. Até as religiões historicamente não colaboraram. A relativa unidade característica da Europa até os dias atuais é resultado da forte influência da Igreja pela maior parte da história do Velho Continente. A Igreja dizia que Deus era homem, pai e senhor, quando nunca existiu real evidência sobre. Ela dizia também que apenas homens podiam ser padres, bispos, sacerdotes; as mulheres que virassem freiras submetidas ao isolamento. As mulheres sempre ocupavam os menores cargos na Igreja, e ser contra isso era ser contra Deus.
Como realmente não se achar inferior numa sociedade assim? Uma sociedade que proibia de todas as maneiras que as mulheres pensassem. É hipócrita quem diz que isso não é característica de autoritarismo e opressão. “Pensar” sempre foi o ato mais detestado em regimes totalitários, como ditaduras, até a do Brasil é um exemplo, pequeno, mas eficiente. No livro 1984, de George Orwell, isso também fica claro, pois “Guerra é paz. Liberdade é escravidão. Ignorância é força.” Entretanto, a ditadura dos homens já acabou - mesmo que ainda não pareça.
Margaret Hamilton é apenas uma das muitas provas. Bem antes dela, no começo do século XIX, embora a época não favorável, Ada Lovelace apresentava pela primeira vez a ideia de computação universal, fundamental para o surgimento dos computadores do século seguinte. Marie Curie recebeu dois prêmios Nobel em Física (1903) e Química (1911). Rosalinda Franklin foi quem desenvolveu os trabalhos sem os quais a descoberta da forma do DNA, em 1953, não seria possível. Limor Fried é engenheira eletricista pelo MIT, dona de uma das maiores indústrias de dispositivos eletrônicos da América, a Adafruit (em homenagem a Ada Lovelace), e uma das pioneiras do movimento open-source e DIY (Do It Yourself). Jennifer Doudna é a líder do time responsável pela descoberta no ano passado de uma maneira revolucionária de editar genes. Vale aludir também que já existem mulheres padres (madres), bispas, presidentes, astronautas etc.
Assim, na 78ª edição do Jornal PET Elétrica, convidamos você, nosso caro Leitor, a entender melhor sobre essa Grande Mudança com o artigo “Ciência: coisa de menina”. Convidamos também a conhecer sobre outra transformação, resultado do poder que a Medicina e a Engenharia têm juntas, com o artigo “ Cirurgia Robótica: uma parceria auspiciosa entre a Medicina e a Engenharia”. A Medicina também é abordada em “A Internet das Coisas aplicada à Medicina e aos Cuidados com a Saúde”, enquanto os robôs aparecem mais uma vez em “Cooperação entre Robôs”. Em “O futuro do transporte ferroviário”, trazemos as novas perspectivas garantidas pela tecnologia maglev. Por fim, é com prazer que anunciamos a abertura da primeira chamada de trabalhos do Jornal PET Elétrica (https://sites.google.com/a/ee.ufcg.edu.br/jornalpet/home/chamada-de-trabalhos).
Boa leitura a todos!
Emilly Rennale Freitas de Melo
Equipe Editorial do Jornal PET-Elétrica
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